A educomunicação é um termo criado pelo professor Ismar de Oliveira Soares, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, baseado nas pesquisas de Mario Kaplún, comunicador uruguaio, que pela primeira vez pronunciou o termo educomunicador. Segundo registros, foi Kaplún quem denominou de educomunicador o comunicador que trabalhava com educação para os meios. Porem, foi Soares que batizou de educomunicação esse campo emergente de intervenção social.
Para se falar de educomunicação é necessário ter em mente que estamos falando de um campo ainda muito novo e por isso ainda em constante transformação. Salvatierra (2006) observa a importância da trajetória das reflexões de Soares, que teve início em 1970, bem como as do projeto Leitura Crítica da Comunicação (LCC)1 , que teve início nos anos 80, na discussão entre mídia e educação. Ambas as reflexões contribuíram para que se iniciassem trabalhos junto a comunidades de baixa renda, o que foi fundamental para o reconhecimento de que a relação que a recepção tem com os meios de comunicação não poderiam mais se limitar a uma visão funcionalista e maniqueísta.
Salvatierre (2006) aponta que foi após pesquisa realizada em 1997 que a educomunicação surgiu no cenário nacional: “Soares conclui que um novo ofício já vinha sendo exercido por um profissional diferenciado, denominado educomunicador, e que, reconhecido esse novo profissional, se evidencia a emergência de um novo campo: a Educomunicação”. ( Salvatierra, 2006, p.243). Esse novo campo de intervenção social se manifesta, de acordo com Soares, em cinco áreas. Porem, dentre as cinco especificadas por Salvatierra (2006), citarei apenas duas delas que condizem com a proposta aqui presente:
• A área da mediação tecnológica nos espaços educativos, constituída pelos esforços para identificar a natureza da interatividade propiciada pelos novos instrumentos da comunicação e de democratizar o acesso as tecnologias, desmistificando-as e colocando-as a serviço de toda a sociedade.
• A área da reflexão epistemológica sobre o campo da educomunicação, que inclui a pesquisa e a avaliação sistemática, destinadas a compreender a complexidade das relações entre comunicação e educação.
Sobre os fundamentos deste novo campo, Salvatierra (2006) destaca:
• O “empoderamento” das pessoas para se expressarem e, portanto, para se apropriarem dos recursos midiáticos a partir do seu ponto de vista e dos seus próprios projetos e interesses;
• A aplicação do diálogo entre os agentes no processo educativo, com a promoção das capacidades e habilidades pré-existentes, mas pouco desenvolvidas, tendo como resultado o uso cada vez mais intenso das novas tecnologias e de novas linguagens na interação humana e grupal;
• A formação dos agentes educacionais para a mediação social de conflitos e para a promoção de valores de solidariedade social;
• A ampliação da capacidade dos agentes culturais para a discussão de temas transversais e próximos ao cotidiano social, tais como sexualidade, direitos e cidadania, violência e meio ambiente, entre outros;
• A promoção da gestão participativa dos processos comunicativos. Pressupõe que novas subjetividades sejam desenvolvidas, sendo elas: a) a ampliação do coeficiente comunicativo dos sujeitos, b) o fortalecimento da noção de cidadania como meta a ser alcançada, c) a abertura para a convivência em cenários de complexidade social, e d) a motivação para o exercício do protagonismo.
Outra função da educomunicação é o desenvolvimento de um ecossistema comunicativo2, que tem o intuito de horizontalizar as relações dentro de espaços de sociabilidade. Sendo assim, a educomunicação está ligada ao desenvolvimento da crítica e do desejo de emancipação, dentro de um ambiente de diálogo e discussão.
Analisando as práticas educomunicativas, Salvatierra (2006) acredita que os agentes do processo educativo são expostos também a uma experiência estética3, a medida que vivenciam dinâmicas, contrapõem idéias, ampliam o repertório, participam de reflexões, de analises e do processo de produção coletiva.
A autora afirma ainda que a educomunicação contribui para o conceito moderno de emancipação, reconhecendo a afetividade, a necessidade do vinculo e da experiência qualificada. “Educomunicação seria um novo campo de intervenção social não mais por estabelecer o dialogo ou mesmo o ecossistema comunicativo, mas por propiciar a experiência estética”. (SALVATIERRA, 2006, P.251).
Sendo a educomunicação uma intervenção social que visa a educação através dos meios de comunicação, é importante refletir sobre a sua contribuição para a transformação dos agentes do processo educativo não só de forma racional, mas sensorial também. De acordo com Salvatierra (2006):
“[...] percebe-se que os campos da Comunicação e da Educação estão marcados muito mais pela racionalidade, pela tomada de consciência analítica e reflexiva do que pela concepção que acredita que a cabeça que pensa está no corpo que sente, ou seja, em uma experiência que seja estética e não somente analítica. Assim, torna-se necessário demonstrar como ocorre a experiência estética em contrapartida ou juntamente com a tomada de consciência crítica, analítica e dialógica.” (SALVATIERRA, 2006, p.251).
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1 O LCC é um programa de leitura da comunicação desenvolvido pela UCBC a partir do início dos anos 80, e patenteado em seu nome, que tem o objetivo de possibilitar à sociedade, especialmente aos grupos organizados da sociedade civil – igrejas, movimentos sociais, escolas etc. – instrumentos acessíveis que permitam um maior conhecimento de todo o processo da comunicação, seja aquela produzida e difundida pelos meios de comunicação social ou pelas diferentes instituições sociais, como a que se faz presente nas próprias estruturas organizacionais.
2 “Segundo Soares, a expressão ecossistema comunicativo diz respeito a uma complexa teia de relações comunicativas que se dão no ambiente escolar e em outros espaços de sociabilidade. O autor advoga que, na perspectiva de incremento de seu ecossistema comunicativo, o ambiente escolar deveria propiciar espaços onde professores, alunos funcionários e pais de alunos sentassem, dialogassem e discutissem os problemas da escola, da comunidade ou mesmo do Estado de forma franca, aberta e, consequentemente, democrática”. (SALVATIERRA, 2006, p. 244)
3 ”Referimo-nos a uma dimensão da experiência que vai além da apreensão racional e mobiliza afetos, sensações e emoções. [...]Uma experiência que contem em seu bojo processos complexos de reflexão, que podem ser ou não explicitados por meio da argumentação, do discurso e da discussão. Uma experiência que não se baseia somente na analise objetiva, mas também na apreciação do que foi produzido, apreciação que ocorre pela percepção sensorial e racional. Neste sentido o ser que pensa é o mesmo ser que sente, que percebe (ouve, vê, toca, degusta, saboreia). Estética, nesse sentido, não é apenas a apreciação do belo”. (SALVATIERRA, 2006, p. 249)